Friday, June 8, 2012

O país do “não”


Há um país, não muito longínquo, cujo nome, traduzido para portugês, é “o país do não”. Nome estranho este, não é? Mas é assim. O país do “não”.
  
É um país, na realidade, onde todas as afirmações são respondidas com um “não” enfático. Depois disso seguem-se respostas mais ou menos relacionadas com as afirmações iniciais mas sempre com um “não” em cada frase. Daí o nome do país. Na realidade eu chamar-lhe-ia “o país dos surdos” porque pareceu-me que as pessoas nem ouviam a afirmação inicial. Apenas se concentram no ripostar negativo.
 
Muito estranho este hábito. Mas, realmente, não admira que o país tenha adquirido aquele nome, “o país do não”. Não se sabe bem se foram os nativos que escolheram o nome ou se lhe foi dado por algum invasor de outros tempos. O que é certo é que o nome aplica-se bem.
 
Para compreender bem esta curiosidade preciso de dar uns exemplos.
  
Uma pessoa diria, por exemplo, que o carro do vizinho estava lavadinho e todo brilhante. A primeira resposta poderia ser – ah, mas aquilo “não” é novo! Aquilo ele comprou numa sucata qualquer e depois mandou pintar. Está bem, responderia eu, mas eu não disse que era novo. Eu disse apenas que estava lavado e brilhante. Tarde teria eu piado. A conversa já teria desmoronado e não haveria saída para a conversa do “não é novo”. Diram também que fui eu que dei a entender que... e embora eu pudesse repetir o que disse ou tivesse deixado de dizer, o que é certo é que já não haveria retorno para uma discussão sobre o que eu disse ou não disse e como disse. Mas nada a ver com o carro estar lavadinho. Este conceito já se teria perdido pelo caminho.

Não sei se os tempos dos verbos desta frase estão todos como deve ser, mas espero que dê para entender o exemplo.

Vou dar outro exemplo. Passou-se num café onde afirmei, por graça, que agora com o calor e com as chuvas tardias tinhamos de ter muito cuidado com os plasmódios voadores da malária porque estes poderiam entrar-nos pelos ouvidos e lá vamos nós de cama com umas febres que não têm graça nenhuma. Ouvi imediatamente que “não”, os plasmódios não voam, muito menos os da malária, e que, quando muito, entrariam pelo nariz, mas nunca pelos ouvidos. Fiquei esclarecido. Levei com uma retórica elaborada sobre o ciclo de vida do plasmódio da malária, bem como com umas acusações de ignorância que ainda hoje me ressoam nos ouvidos, por onde, fiquei a saber, não entram os plasmódios, felizmente. Não consegui convencer os meus acompanhantes que o que eu tinha dito o tinha feito apenas por graça porque, disseram-me, o tom com que eu tinha dito "não" tinha nada de gracejo e portanto eu fiz uma afirmação que "não" estava correta.
  
Foi aí que comecei a pensar que talvez o país se devesse chamar “o país dos surdos”. Porque aquele intercâmbio de palavras mais me pareceu uma conversa de surdos do que outra coisa.

Mas depois de pensar bem concordei que realmente o “não” superou todas as outras possíveis alternativas. Pelo menos estatisticamente falando.

Ficou bem claro para mim que para além de eu “não” ter dito nada acertado, o que era certo era que o plasmódio “não” voa, o plasmódio “não” entra pelos ouvidos, quando muito pelo nariz, mas nunca pelos ouvidos, que “não” o disse em tom jocoso, e que “não” valia a pena eu tentar esclarecer porque já “não” havia a possibilidade para tal. O dano estava causado e “não” me deixariam explicar. Também notei que quase “não” tive oportunidade para falar porque todos começaram a falar ao mesmo tempo sem se aperceberem do que cada um estava a dizer. Mas isso é outra estória.

Este país também anda mal de finanças mas “não” há solução, disseram-me. Mas também me garantiram que “não” vai à falência porque isso também “não” é uma opção. 

Este país também está no Euro 2012. Dizem que "não" tem hipótese... porque "não" tem a sorte ao seu lado, o seu triste fado é de "não" ter fado...

Mas... desculpem... divago um pouco...
 

Thursday, June 7, 2012

O que é o amor?


Perguntaram-me:
O que é o amor?
Sinceramente,
não sei se sei
o que é o amor.

Sei que é uma coisa
sem definição,
que esperam de mim,
que eu dê aos outros,
que eu busque nos outros,
mas não sei bem como.

Mas sei onde se aprende.
Isso eu sei!

Só não sei se é isso
que eu aprendi,
ou se eu
não estava atento à lição.

Aprende-se o amor
na violência
das cenas de cinema,
na mesquinhice
dos diálogos apaixonados na TV,
nas fantasias
dos romances amorosos,
nos bonecos
das bandas desenhadas.

Aprende-se o amor
dos pais ausentes,
da falta de colo,
em ter de ser forte
quando a idade
não nos permitia.

Também se aprende o amor
nos beijos dos namorados
nos bancos dos jardins,
nas basófias dos colegas,
na indiferença dos professores,
nas caras sérias dos amigos,
nas amarguras das vizinhas.


E aprende-se o amor
na fisionomia fechada
da nossa tia na aldeia,
na indiferença do pai
que nunca abraçou a mãe,
nas infidelidades do tio,
homem muito respeitado,
nas aventuras dos primos.

Aprende-se o amor
na falta de abraços
entre familiares,
na falta de beijos
fora das camas,
na falta de carinho
em tempos de tristeza,
nas críticas
aos que tropeçavam.

O amor aprende-se assim,
observando os outros,
os amigos,
os familiares,
os professores,
as autoridades,
os governantes,
que afinal também não sabem
o que é o amor.

E assim,
sem saber o que é o amor,
tentamos aprender dos livros,
e a ensinar esse sentimento
que deve ser muito belo,
que faz girar o mundo,
mas, pelo que vejo,
ninguém sabe o que é
e todos por ele anseiam.

E agora,
na realidade,
o que é o amor?
Ainda não sei se sei,
ou se alguém mais
saberá o que é!