Uma pergunta muito válida tendo em conta que há tantos blogues por aí com conteúdos tão ricos e tão diversos. Mas eu vou tentar explicar o porquê desta minha aventura.
Há algum tempo atrás uma amiga, muito amiga e muito minha, sugeriu que eu criasse um blogue. Achava que eu devia publicar coisas que tenho escrito ao longo dos anos e que muitas vezes não têm sido publicadas nem partilhadas. Achei a ideia interessante, mas mesmo arriscando magoar a minha amiga, não segui a sugestão. Não segui porque não senti coragem de criar um blogue só para publicar coisas, ideias, poemas, sem ter uma ideia fundamental que guiasse o conteúdo deste blogue. E depois quando me faltassem as ideias? O que é que eu iria fazer? Agora não. Vou pensar no assunto. E fiquei a pensar no assunto.
E assim a ideia do blogue foi ficando na gaveta, como muitas ideias que temos, todos nós, e que receamos partilhar porque não temos coragem de nos expor ao mundo, porque não achamos as nossas ideias assim tão válidas para que os outros se possam interessar, porque achamos que as nossas ideias vão contra a corrente, vão contra o conceito que possam fazer de nós, vão contra o conceito a que sentimos que nos devemos cingir, para não sermos excluídos do grupo de que tanto desejamos fazer parte, sei lá, por mil e uma outras razões.
Mas esta ideia do "ser excluído" voltou à superfície há dias enquanto lia um livro de Amin Maalouf, As Identidades Assassinas. Para quem o não leu, vale a pena. E desse livro surgiu-me a ideia fulcral para este blogue: um blogue onde amigos e amigas, pessoas queridas, curiosos e curiosas, interessados e interessadas, possam partilhar as suas múltiplas experiências, as múltiplas facetas das suas identidades, aquelas que por vezes até, durante muito tempo escondemos porque a sociedade em que vivemos, o mundo em que vivemos, quer globalizar tudo e portanto quer que nos sintamos "no fundo, no fundo" aquilo que é considerado "normal" no núcleo de amigos e amigas, na família, na vila, no bairro, no país em que vivemos, na empresa onde trabalhamos, na escola que frequentamos.
E o nome? Bom, o nome... é porque "no fundo, no fundo" não somos uma coisa apenas. No fundo, no fundo, não somos aquilo que é esperado de nós. Somos muito mais. Somos uma mistura muito complexa de contributos vindos das mais variadas direcções, das mais variadas fontes. No fundo, no fundo somos todos mestiços. Somos mestiços em um ou mais aspectos. Pelo sangue que nos corre nas veias, há mais ou menos gerações misturado por algum motivo que se calhar (ah! essa expressão tão portuguesa!) se calhar nem conhecemos, ou pelas línguas que falamos que nos levaram a misturar termos desconhecidos dos nossos pais e dos nossos queridos professores que tanto se esforçaram para que falássemos um português correcto, ou pelas culturas em que nos inserimos tendo sido receptores de particularidades culturais que de nós fizeram alguém diferente dos nossos amigos que não tiveram essas oportunidades. E tudo isso faz agora parte de nós. E tudo isso faz com que não consigamos, no fundo, no fundo, ver o fundo do que somos.
Mas todas essas características misturadas em cada um de nós, essas mestiçagens, que tanto valor adicionaram ao que nós somos, quando defendidas fora do seu todo também podem contribuir para nos empobrecer perante os olhos de outros, criando um pernicioso "nós" e "eles" que tanto tem contribuído para cisões, para desavenças, para um mundo menos acolhedor. A tese não é minha, mas identifico-me com ela como se fosse.
E então achei que valeria a pena criar mais um blogue. Um blogue onde pessoas com as vivências mais variadas possam expor a riqueza do que são, não apesar dessas vivências, mas por causa dessas vivências. Um blogue onde a palavra chave possa ser enriquecimento de todos nós através de todos nós. E que, quem sabe, a chama pegue e se comecem a valorizar pessoas com muitas ou poucas mestiçagens em vez de os marginalizar.
Eis o tema. Aventureiro? Acho que é. Demasiado ambicioso? Talvez. Mas decidi atirar-me a ele agarrando-me, com unhas e dentes, às palavras de Pedro Barroso na sua composição Agora não é tarde.
E não é tarde para tentarmos melhorar o mundo em que vivemos, nem que seja com uma minúscula contribuição para que as diversidades, as mestiçagens que existem dentro de cada um de nós passem a ser valorizadas. Para que as nossas mestiçagens não sejam motivo de desavença mas sim motivo de acolhimento e de melhoramento dos pequenos mundos onde cada um de nós faz pela vida.
Lindo!
ReplyDeleteBigada! beijo grande